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Blatter será eleito, Ricardo se apresenta em 2015', garante Havelange

Em entrevista exclusiva ao LANCENET!, João Havelange fala do futuro da Fifa e da Copa de 2014, Olimpíadas de 2016 e regras do futebol

Os poderes de João Havelange na Fifa permitem o prenúncio: "Blatter será (re)eleito, Ricardo Teixeira se apresenta em 2015".

Aos 95 anos, Havelange só cansou das viagens. Agora, limita-se aos compromissos diplomáticos mais importantes. A Fifa segue a política do brasileiro. No Comitê Executivo, os membros lhe devem respeito e cumplicidade.

O discurso pausado e lúcido, com raros lapsos de memória, vai da cortesia e altruísmo à imposição e domínio. E é revelador quanto à escolha da África do Sul para a última Copa. Bem como à definição de Cuiabá (MT) e Manaus (AM) como sedes, e o veto ao Morumbi (SP) no Mundial no Brasil.

Havelange atribui revanchismo aos ingleses, por terem perdido o controle da Fifa, às acusações de manipulação de votos para as Copa de 2018 e 2022. E enxerga da mesma maneira os conflitos com lideranças da Uefa. João Havelange (Crédito: Alexandre Loureiro)

Assista à entrevista exclusiva com João Havelange

Na entrevista de mais de duas horas, ele faz sugestões aos Jogos de 2016, críticas aos três níveis de governo, à Lei Pelé e à administração do Fluminense. Confira:

L!: Já dá entusiasmo a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016 no Brasil?

Ah, sim. Veja bem, a assembleia do COI tem 105 membros. Dos quais, 50 são da Europa. Assim fica difícil ganhar algo. Da América, eu tinha o Brasil, o Uruguai e a Colômbia. A pessoa da Argentina faleceu e não foi substituída. A África tinha mais, e no Caribe também mais gente. A Ásia mais do que nós. Assim, o trabalho do (Carlos) Nuzman, como exemplo o Pan-Americano, se mostrou eficiente e nos proporcionou a Olimpíada. É para ser seguido por conta dos benefícios à juventude.

L!: O senhor está preocupado com a morosidade nas obras de infraestrutura da Copa e da Olimpíada?

Quando houve a escolha das sedes, os governos se colocaram à disposição para a Copa e a Olimpíada. Mas os aeroportos e hospitais dependem deles. Os hotéis e os estádios, os governadores sabiam (que precisariam sair). Na Inglaterra estão fazendo todas as obras para os Jogos de 2012. O Comitê não é rico.

L!: Qual o seu grau de participação nos Jogos Olímpicos de 2016?

É preciso frisar o Nuzman como excelente administrador. Ele foi ao México ver as obras para os Jogos Pan-Americanos. Vou saber como andam. O problema é que na Copa são 12 cidades e 32 times. Nos Jogos é uma cidade recebendo gente de 200 países e 28 esportes. Todos chegam e saem quase ao mesmo momento. Nosso aeroporto (Rio) tem capacidade para isso? Se adoece uma delegação, põe onde?Asugestão que dei ao Nuzman foi de fazer contratos com hospitais particulares. Põe no São José, Samaritano e Copa D'or. Hotéis? Tá, tem a Vila Olímpica. E os delegados? Na China, nos Jogos, para ir a qualquer local de competição foi feita uma faixa especial. Ninguém entrava, senão ia preso. É um regime diferente. Mas tem que ter disciplina.

L!: A urgência nas obras tem causado mal-estar entre membros do Ministério do Esporte e do COB?

Você viu as filmagens com a alegria do presidente, governador e prefeito (nas definições da Fifa e do COI)? É uma publicidade, um valor. E depois? Só se fala em política. Ainda não vi contrapartidas.

L!: Como o senhor interfere na Copa do Mundo de 2014 no Brasil?

Algum tempo atrás me ligaram de Cuiabá. Lutei e falei com o (Joseph) Blatter e o (Ricardo) Teixeira para incluírem Manaus e Cuiabá. Para o mundo conhecer a floresta Amazônica, cuidá-la e respeitá-la. Para ver o Pantanal, gostaria que o mundo conhecesse. Um exemplo: 1998 foi a última Copa minha na Fifa. Terminou e a França tinha 60 milhões de turistas ano, classe A e B, deixando 60 milhões de euros. Por conta da divulgação, passou a receber 70 milhões de turistas e euros. O governo tem de entender, e não achar que está gastando. Nunca ninguém foi à África. Antes a Copa era na Europa ou na América do Sul. Fizemos o rodízio e foi o primeiro evento importante lá. Diziam que não daria certo. Só posso dizer isso se lhe der a missão.

L!: O fato de o Comitê Organizador Local (COL) ser pequeno e composto por familiares e amigos de Ricardo Teixeira é alvo de críticas...

Olha, só. Precisa acabar com o "vou fazer a Copa e ficar rico". Estou na Fifa desde 1957. Estava no COI desde 1963 e faltei a três reuniões, paguei tudo do bolso. Quando cheguei à Fifa eram 12 membros da Europa, um da América do Sul, um da Ásia e outro do Caribe (América Central). Todas as decisões eram europeias. Fiz um Comitê Executivo de 24 – oito da Europa, quatro da África, quatro da Ásia, seis das Américas e dois da Oceania. Se vai à Organização das Nações Unidas (ONU) são 180 países na assembleia. Mas se o conselho dos sete (maiores) diz não, acabou. Na Fifa, se é do Taiti e não tem dinheiro, pode participar do futebol.

Nota da Redação: Reynald Temarri é o representante do Taiti e está suspenso da entidade por suposto envolvimento na venda de votos para as Copas de 2018 e 2022.

L!: Mas há membros de países que nunca jogaram uma Copa. Isso visa à inclusão e à difusão do futebol?

Sim. Além de 25 no Comitê para decidir aspectos técnicos, botei membros de todos os continentes em comissões auxiliares. Pagamos passagem, hotel cinco estrelas, carro e valor para gastos diários. Nada lhes falta. Dos 187 países na gestão, fui a 186 e repeti todos ao menos três vezes. Por ano respondia em inglês, francês, espanhol e alemão. Tinha secretária para 6 mil cartas. O presidente da Onu foi ver algum país?

L!: Não teremos muitos elefantes brancos após a Copa no Brasil?

O senhor já foi à Holanda? Vá ao estádio do PSV. Eles têm um estádio com centro de convenções, restaurantes e boutiques. Lá é o único lugar com os artigos de venda deles com 30% de desconto. Não será elefante branco. Em Saint-Denis (FRA) hoje se joga futebol, rúgbi e tem corrida de moto. Lá tem 7 mil lugares de estacionamento, metrô e ônibus. Aqui o sujeito se desespera e deixa o carro em qualquer lugar. Uma vez Carlos Lacerda (ex-governador do Rio) tinha um problema político. E me disse: vamos fazer um jogo internacional? Fui ao Paraguai. Paguei e vieram. Entraram 128 mil no Maracanã. E não houve problema político.

L!: Quais as razões para a Fifa ser uma entidade tão lucrativa?

Olha só, o futebol da Copa do Mundo você vê até seis vezes por superexposição. Essa imagem atinge 40 milhões de pessoas e a Olimpíada não chega a 20 milhões. O primeiro programa que criei na Fifa foi rechaçado. Passou na segunda tentativa. Incluímos as mulheres, as categorias de base e consegui os contratos com a Coca-Cola e a Adidas. Em 1974 e 1975, o presidente da Coca me pediu para apresentar o acordo em Londres. Um jornalista inglês disse: qual seu interesse no contrato? Esperei uma fração de segundos, Deus deve ter posto a mão em minha cabeça. Veja a maldade, quero que ele se dane! Disse: possivelmente tomo um copo de Coca-Cola. Todos deram gargalhadas. Do meu país tive só um passaporte diplomático. Eu ligava na embaixada, mas tinham medo que eu pedisse algo. Esse é o meu país. Isso me dói.

L!: Então a Fifa cresceu à base de profissionalismo e publicidade...

Desculpe, me permita. Quando cheguei à CBD diziam: você não entende nada de futebol. Foi a sorte. Escolhi bem o técnico, o administrador, o supervisor, e disse: não vou fazer time. Na Viação Cometa não dirijo, não troco pneu. Mas quando você observar um ônibus parado, espere.O motorista troca o pneu em 17 minutos. O senhor prepara, trabalha. Isso é administrar.

L!: Por que a ISL, para quem foi vendido os primeiros direitos de televisão da Fifa, fracassou no Brasil?

Disse para que não fizessem contratos. Fizeram com o Flamengo, o Grêmio e o Boca Juniors. Botaram dinheiro e jamais viram. No Fluminense sou presidente de honra. Hoje não vou. De 16 (jogadores), oito são da Unimed. Ela não está lá para isso, só para colher publicidade.

L!: O senhor é contra a Lei Pelé?

Tem que mudar. O clube tem que ser dono do jogador. Ele investe e dá publicidade. Jogadores iguais no Flamengo e no Olaria custarão bem diferente.Abandeira do clube é dada ao jogador, que foi tirado dele.

L!: E quando o clube fica meses sem pagar salário ao jogador?

O Conselho Nacional do Esporte e o Ministério do Esporte têm que ver isso. Se o clube não tem condições, não pode fazer profissionalismo. Não gostaria de muitos presidentes na minha empresa. No meu tempo você dava o nome ao clube.

L!: Andrés Sanchez e Luis Álvaro Ribeiro, presidentes de Corinthians e Santos, se dizem contra a perpetuação no cargo. Como o senhor avalia o tema?

Quem não está no poder acha que tem que estar e quem chega não quer sair. Essa que é a verdade. Se colocar esses dirigentes na CBD (CBF), eles veem. O Brasil não é Rio e nem São Paulo. Tem que ter consciência e ir a todos os cantos.

L!: O Instituto João Havelange segue dando consultoria ao governo da Bahia para a Copa-14?

Mandei parar com isso. Na verdade, quero fazer um museu junto ao Comitê Olímpico Internacional na Praça Mauá (centro do Rio). Não quero nada do governo. Será com o comitê.

L!: O senhor é a favor da tecnologia em auxílio à arbitragem?

Olha só: se discute o erro após um jogo. Faz 50 anos que é assim. Em 1970, fomos campeões, o melhor time. Em 1990, na Itália, o Ricardo tinha sido eleito e perdeu. Em 1994, ele me pediu um favor: o que eu faço? Disse: pega o que sobrou da comissão de 1970: (Mario Jorge Lobo) Zagallo, (Carlos Alberto) Parreira e (Admildo) Chirol. E ganhou. Na Copa do México, o campeão foi a Argentina com o gol de mão. Só se fala nisso, depois de tantos jogos. Se eliminar, você se arrepende depois. Não queira matar sua vida. Você vira robô.

L!: Como o senhor vê o Maracanã e o Estádio João Havelange?

Uma vez me chamaram de imbecil quando falei em implodir o Maracanã. Eu o transformavaem um centro para a gente de Vila Isabel e fazia o estádio em outro lugar. Não se chega lá. O César Maia (ex-prefeito do Rio) disse que faria um estádio com meu nome. Falei para desapropriar (o entorno) e fazer um estacionamento. Não fez e é o problema que temos.

Sucessores, Pitos e a Política  na Fifa


Joseph Blatter


Ricardo Teixeira


Chung Mong Joon


Issa Hayatou

- Ele era do marketing da (Cronometragem Esportiva) Longines. Fiz  acordo  para ele executar um programa (a partir de 1975). O secretário (da Fifa) da época disse a ele: você não fica dez dias e vai embora. Então eu disse: quem vai é você. Mandei ele (Blatter) ir à Adidas e foi lançada a primeira copade juvenis na Tunísia, na África. O Blatter , em 1º de janeiro (de 2011), será (re)eleito e estarei lá. Ele foi um secretário nota dez, tem cultura e experiência. É um irmão ou um filho. Com o Blatter dará 40 anos da mesma política, e será 50 no total (com o Ricardo Teixeira). No fundo, o Blatter é o Brasil. - O Ricardo separou da minha filha e fiquei muito triste. Minha senhora me chamou e disse: "Não esqueça que ele é o pai dos teus netos". Então,
mudei. O Ricardo queria se lançar presidente (da Fifa) em 2011. Disse para se apresentar em 2015, pois o Blatter, em 1º de junho, será
(re)eleito. O Ricardo é dedicado, tem 30 anos a menos. Seria um bom presidente por ter administrado a CBF. Acho que seria de justiça em 2015. Com a Copa bem organizada, ele vai demonstrar capacidade para organizar a Fifa. É a oportunidade de estarmos presentes no cenário mundial.
 - Fiquei sabendo das declarações dele de que gostaria de ser presidente
da Fifa. Mas também já dei a minha. O presidente da Hyundai (vicepresidente do Comitê Executivo da entidade pela Coréia do Sul) está fora. Eu lhe fiz uma carta para entender que não se metesse. Não é por que ele é rico que será presidente. O Ricardo Teixeira pode ter defeitos, mas se preparou, fala mais de duas línguas, é culto e  vem de um país com cinco títulos. Está eleito na CBF e não sofre oposição na Fifa. Nunca faltamos à Copa do Mundo. O futebol do Brasil
vai bem e a América do Sul o respeita.
 - O (Juan Antonio) Samaranch recebeu certa vez o presidente da Confederação Africana de Futebol, Issa Hayatou (vice presidente do
Comitê Executivo da Fifa (por Camarões). Este chegou por voto meu, nos EUA. O Samaranch chamou um secretário da Etiópia, que conheci
de pé no chão. Paguei a passagem dele para ir a Londres. Lá estudou cinco anos. Na Uefa, o Issa me atacou. No hotel, me procurou a
senhora do Mayer Vorfelder, vice da Uefa não reeleito. Ela veio chorando e eu disse: "Ele será
o presidente do comitê organizador de uma Copa". Tem que ter habilidade política.
      

Abertura da Copa de 2014

- O senhor conhece ou já foi alguma vez à tribuna de honra do Morumbi? Quando sai um gol, o senhor bate a cabeça no teto. Se tiver de fazer, que se faça em um lugar novo, o do Corinthians. Essa é a minha decisão e será a da Fifa. Um estádio novo
para 50 mil, 53 mil pessoas.

N. R.: Havelange se refere primeiro ao estádio do São Paulo, cuja proposta de reforma foi rechaçada pela Fifa. Depois, ele se volta ao Fielzão, planejado inicialmente para 48 mil lugares, em Itaquera. Apesar da insistência da equipe de reportagem, o presidente de honra da Fifa se furta a responder de onde virá o dinheiro para a ampliação do estádio para 65 mil lugares, uma exigência da entidade para a abertura do Mundial.

    

Denúncia de compra de votos

A notícia veio de um jornal inglês. Faz uma análise. Cheguei à Fifa e o senhor Stanley Rous era o presidente. Nunca mais ocorreu. Não estão satisfeitos e me atacam. Não se conformam. Até a Copa na Inglaterra, em 1966, não tinham sido
campeões. Esperei duas horas no aeroporto.
N. R.: Em 1º de agosto deste ano, o L! publica entrevista com o jornalista britânico Andrew Jennings, que qualifica as administrações de Havelange e Blatter como "anos negros da Fifa". Há uma semana, o "The Sunday Times" acusa membros da entidade, como o nigeriano Amos Adamu (suspenso), de aceitar vantagens em troca do voto a favor de países candidatos a sediar os Mundiais de 2018 e 2022